quarta-feira, 23 de junho de 2010

Num quarto de hotel



Naquela noite fazia muito frio. Como eu estava longe de minha casa e já passava da meia-noite resolvi me hospedar num hotel.


Como eu não tinha muito dinheiro acabei me hospedando num de quinta categoria mesmo, cuja fachada prenunciava o ar decadente de seu interior.


Por dentro era como eu havia pensado. A recepção era suja e com alguns pisos quebrados. A pintura das paredes e do teto estava descascando, e em alguns cantos dava para ver manchas de bolor e teias de aranha. No centro havia um velho balcão de madeira já dominado pelos cupins e num dos cantos tinham duas poltronas velhas que cheiravam a mofo.


Contrastando com aquela paisagem decadente havia um rapaz bem trajado, com roupas extremamente limpas, atrás do balcão.


-Boa noite! Em que posso ajudá-lo?


-Boa noite! Quero um quarto individual.


-Custa R$ 15,00 a diária.


-Aqui está!


-Ótimo! Quarto número nove. É só virar a esquerda e ir até o fim do corredor. Aqui está a chave.


No corredor a cena era a mesma, com paredes emboloradas, uma teia de aranha aqui e ali e tinta descascando. O quarto em que eu ira passar a noite também não era diferente. Tinha o mesmo ar de decadência e esquecimento do resto do hotel. Ele era bem simples. Havia uma velha cama de madeira, uma mesinha com um abajur, um pequeno rádio relógio, um armário de madeira, também dominado por cupins, e, na janela tinha uma cortina toda esfarrapada.


Apesar da sensação de extremo abandono que aquele lugar me passava, como eu estava cansado me deitei na cama e logo dormi.


No meio da madrugada acordei com uns barulhos que vinham da rua. Levantei da cama, fui até o armário, abri a minha bolsa, peguei uma garrafa de água e bebi. Quando fui deitar novamente, ouvi alguém bater na porta do meu quarto. Fui abri-la, mas, não tinha ninguém e grande foi o meu espanto quando, depois de fechar a porta, vi que tinha uma mulher sentada na cama. Como ela entrou no quarto? Sinceramente não sei, a janela estava fechada e pela porta ela não entrou. Isto é algo que foge da minha compreensão, mas no mundo muita coisa não pode ser explicada e este fato é uma delas.


Toda trajada de preto, ela parecia trazer consigo toda a escuridão da noite, e, olhar para os seus olhos era a mesma coisa que entrar nas profundezas do mar. Era muito bonita, elegante, sua pele tinha o tom do brilho da lua, e seu corpo exalava um intenso perfume misterioso.


Eu nunca tinha visto uma mulher tão atraente e enigmática. Tudo nela era assombro e delicadeza. Ela era a primordial, a Mulher das mulheres, o feminino em toda a sua intensidade. Fiquei atônito. Não conseguia me mexer. Eu estava paralisado.


-Venha!


Foi só isso o que ela disse, mas aquela palavra carregava todo um poder de encantamento. Atendi seu chamado e caminhei até ela.


Ela carregava todo um mundo obscuro consigo. Ao beijá-la senti-me imenso. Agora não éramos homem e mulher, partilhávamos do infinito, íamos além de nossa união corporal.


Naquele momento éramos somente vida e nada mais. Aquela sensação foi muito estranha para mim. Era como se ela fosse um abismo e eu me jogasse lá dentro, mas sem ser tragado e perder minha consciência. Pelo contrário, minha consciência juntou-se a dela, éramos ao mesmo tempo um e dois. Nossos corpos se interpenetravam e formávamos o infinito...


Novamente adormeci e quando acordei já era dia. Estava uma manhã ensolarada e ao olhar para o lado tal foi meu espanto ao ver que a mulher não estava mais lá. Não havia nenhum indício físico de sua presença, pois a porta estava trancada e a chave estava por dentro do quarto. Mas isto não importa, pois nem tudo precisa ter uma existência física para ser real.


Então saí do quarto, fechei a porta, entreguei a chave ao atendente e fui andando pela rua à procura de um café...